19 janeiro, 2023

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Resenha :: O morro dos ventos uivantes


 
Olá, passando por aqui para relatar sobre meu retorno a Wuthering Heights, revisitar as charnecas depois de tantos anos se tornou quase fundamental. Afinal, na primeira leitura eu havia amado, mas não senti estar completamente ciente de todos os mistérios que envolviam aquela história, incluindo as vidas que estavam ali retratadas, quando a mão que as havia escrito.

E posso com sorriso afirmar que a própria autora me apresentou sua história, calma não é nada espiritual, foi após ler a biografia sobre a vida de Charlotte Brontë que pude compreender tanto quanto possível a autora, sua vida e seus personagens.

"Aqui, chego a imaginar possível um amor que dure a vida inteira; e dantes alimentava em firme descrença em qualquer amor capaz de durar mais de um ano."

Essa história, tem em uma aparente simplicidade um de seus principais trunfos, claro que assim como sua irmã aponta no prefácio que faz para publicação de uma segunda edição, póstuma, a autora, por ser esse seu primeiro romance, tem uma crueza na escrita e no estilo. Talvez por isso tenha atravessado de forma tão intensa os séculos, pessoas como eu e você, estarmos a volta com essa história.


Eu disse simplicidade porque temos aqui um relacionamento amoroso, com envolvimento de sentimentos que não são "amor e redenção". Ao contrário, tanto Cathy quanto o próprio Heathcliff deixam, claro, que não se trata de um mocinho com passado obscuro que encontrará no amor sua redenção. Suas vidas não são movidas por sentimentos de nobreza ou que ao se depararem com esses encontraram um novo sentido de existência.

"Mas o Sr. Heathcliff forma um contraste singular com sua morada e estilo de vida. Ele é um cigano de pele escura no aspecto, em roupas e maneiras de um cavalheiro"

A história começa nos tempo presente, com a chegada de um forasteiro, Lockwood agora locatário da fazenda Thrushcross Grange e nos conta por seu ponto de vista, como é a vida naquele local afastado para o qual resolveu buscar refúgio, e como foram suas visitas nada amistosas ao seu locador Heathcliff. E aqui começa as armadilhas da leitura, tal qual suas charnecas a quem esteja menos atento.


Pois teremos uma mudança de narrador, ouviremos de Nelly que viveu os acontecimentos do passado, contar como a chegada de um menino órfão, muda para sempre a vida daquelas famílias que habitavam e de certo modo ainda habitam aquelas duas casas. E assim, voltamos ainda mais no passado da narrativa, quando se contam também, fatos que aconteceram antes da chegada daquele que viria a ser chamado Heathcliff, e assim, iremos finalmente conhecer a história que os ventos sopram numa nova mudança de narrador. Porque Lockwood volta a narrar a história, porém dessa vez recontando o que ouviu de Nelly.

"Catherine Earnshaw. . . Catherine Heathcliff. . . Catarina Linton. . . . um brilho de letras brancas começou no escuro, tão vívido quanto espectros - o ar fervilhava de Catherines"

A trama não é apenas sobre relacionamentos tóxicos, egoísmo, sentimentos violentos e vingança. Conta também como uma decisão muda e afeta a vida de todos direta ou indiretamente ligados a essa escolha, contém vários alertas sobre o envolvimento com pessoas agressivas e notoriamente problemáticas e como o amor por si não é o bastante. Eu me emociono como Emily deixa claro e nítido que amar pelos dois em um relacionamento não é o bastante porque a mudança pelo amor é individual e cabe a quem precisa exercer sobre si o desejo de mudar. Casamento, relacionamento não muda outro quando o amor é apenas de um.

 "Não sei de que são feitas as nossas almas, mas sei que a minha alma e a dele são iguais"

A mensagem de que para um relacionamento, seja amoroso ou familiar funcionar depende inteiramente de todos os envolvidos é clara e nítida e também serve de reflexão sobre tantos problemas e o fato que somos nós os responsáveis por cada uma das decisões que tomamos, seja a de partir ou a de ficar por mais que os morros uivantes exerçam seu fascínio sobre os seus moradores e v.

Voltar a essa história pela edição da José Olympio foi um prazer imenso, por sua tradutora Rachel de Queiroz, em seu prefácio, se declarar fã incondicional da história, torna ainda mais perceptível o cuidado e talento empregado na tradução. O texto de prefácio merece louvor e destaque, pois de autora para autora Queiroz toca a alma da escritora Emily e cria uma teoria bastante plausível sobre o processo emocional da escrita do único romance de Emily, tão único que a levou direto para galeria dos grandes autores da humanidade.

Informações Técnicas do livro

O morro dos ventos uivantes

Emily Brontë
Ano: 2022
Páginas: 422
Tradução: Rachel de Queiroz
Editora: José Olympio

Sinopse:

“Emily Brontë foi uma mulher independente, incapaz de ser “domesticada” ― traços perceptíveis em O morro dos ventos uivantes, esta obra-prima do gênero gótico, publicada inicialmente sob o pseudônimo masculino Ellis Bell. A escritora morreu em 1848, doze meses após a publicação deste seu único romance, sem desconfiar de que entraria para o seleto grupo de grandes nomes da literatura mundial.

Em uma época regida pelo puritanismo, O morro dos ventos uivantes foi recebido com duras críticas. O choque foi ainda maior quando, em 1850, sua verdadeira autoria foi revelada a uma sociedade habituada a julgar mulheres que, como Emily, fugiam de um ideal feminino fantasioso. A narrativa do amor corrosivo de Heathcliff e Catherine Earnshaw, no entanto, é tão hipnotizante que prende leitoras e leitores no emaranhado de complexas camadas da mente humana. E também na trama de uma paixão violenta, obscura, capaz de sobreviver até mesmo à morte.

Não havia nenhum personagem como Heathcliff na literatura. Considerado um herói byroniano ou o arquétipo do anti-herói atormentado, ele é guiado pela fúria, pelo ciúme e pela vingança. Destrói tudo o que encontra pelo caminho, inclusive ― e sobretudo ― a si próprio. Catherine Earnshaw, por sua vez, não está longe disso. Dividida entre o amor e a ambição, é o avesso do modelo romântico perfeito. Cathy é um espírito livre, uma jovem mimada e arrogante, que tortura e leva à agonia todos que se atrevem a amá-la.

O morro dos ventos uivantes, traduzido e recontado nesta edição pela grande escritora brasileira Rachel de Queiroz, é, sem dúvida, uma obra--prima intensa. E, mais que apenas uma trágica história de perdição, é uma análise meticulosa e assustadora da crueldade do amor, da perversidade humana e dos traumas ― esses que volta e meia retornam a bater e chamar à janela, mesmo que a deixemos muito bem trancada.” - Carina Rissi.

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