28 outubro, 2020

# Ane Forcato # Entrevista

O Clube Entrevista :: Ane Forcato


Oi, faroleiros!


Hoje, trazemos para vocês uma entrevista para lá de especial, com a autora nacional Ane Forcato, que também é tradutora e (surtem!) ela é quem traduziu o quarto livro da série Anne de Green Gables, Anne de Windy Poplars, pelo Grupo Editorial Coerência, que daqui uns meses já poderemos ter em mãos para acompanhar os outros três já lançados (que são maravilhosos, já que estamos falando de Anne). Sem mais delongas, vamos à entrevista.



Ane Forcato é licenciada em Filosofia pela Universidade de Sorocaba. Amante da língua inglesa desde jovem, lecionou Inglês em diversas escolas, assim como para alunos particulares por duas décadas, coroando seus estudos em um curso avançado em Glasgow, na Escócia. Atualmente, é tradutora de quadrinhos europeus e vive em Sorocaba com o marido e uma gata exótica da raça escocesa Scottish fold. Além de traduzir, escrever é seu exercício contínuo, ao qual gosta de se dedicar ao máximo a fim de aprimorar a personalidade de seus textos. Tokio 2020 é sua publicação de estreia. 



 Clube do Farol:  Como você fez para conseguir traduzir um livro de uma série que teve os primeiros livros traduzidos por outros tradutores, dando sequência aos livros anteriores, sem ficar algo diferente para quem lê?


Ane Forcato: Todo texto, seja o original de um autor, ou nesse caso, uma tradução, deverá passar por revisão e preparação de texto. Dessa forma, algum termo ou palavra que tenha "escapado" de sair igual à do livro anterior, será ajustada pelos revisores. É um trabalho de equipe, com vários profissionais envolvidos. Ah, e também trabalhamos com um glossário de palavras-chave. 



 Clube do Farol: Sendo escritora e tradutora, o que você acha mais difícil/complicado: escrever um livro seu ou traduzir o livro de outra autora?

 

Ane Forcato: Escrever é tão prazeroso que às vezes eu me esqueço de como é difícil. Principalmente quando se trabalha com prazo, tudo fica louco com o tempo escoando. Na verdade, envolve desde cansaço mental, até dor nas costas, pescoço estalando e pulsos precisando de alongamento!

Ah, mas a parte boa é infinitamente maior.

Escrever uma história minha é complicado quando chega a hora de ser fiel a referências: mesmo na ficção não se pode inventar certas coisas. Se a personagem terá traços de depressão, preciso estudar a depressão para não ofender quem convive com o problema. Se escrevo sobre um músico, preciso saber com segurança sobre música, a execução do instrumento, etc. Isso porque o leitor deve ser respeitado. Se o personagem músico vai sair voando na noite, eu posso inventar seu vôo, mas enquanto ele estiver ao piano, um pianista deverá se reconhecer nele, ao ler. Então nada de preguiça: pesquisa!

Traduzir é uma trajetória bastante diferente, apesar de ser composta da "escrita de um texto". A semelhança acaba aqui. Ao traduzir, a imaginação não pode ficar solta, a mudança de ponto de vista não pode ser explorada. Traduzir não é adaptar livremente, por isso é uma prisão às vezes, e aí entra a necessidade de ser humilde e não interferir, afinal não é um texto meu! Por exemplo, na época em que os livros de Anne foram escritos, era desejável usar como adjetivo muitos advérbios terminados em "mente", o que na atualidade não é desejável porque o texto fica pesado. Se fosse um texto meu, não teria um só "mente": lindamente, ricamente… já em Anne ocorre repetida…mente, pois pertence ao estilo de uma época.



 Clube do Farol: Para você, qual foi a parte mais fácil de traduzir “Anne de Windy Poplars”? E a parte mais difícil?

 

Ane Forcato: O mais fácil de traduzir Anne de Windy Poplars foi o fato de eu amar a série e o livro 4 ser inédito para mim. Eu lia cada frase com surpresa, e ia fazendo descobertas página a página. Era divertido e me fazia um enorme bem. As partes que eu mais adorava eram as de Rebecca Dew com o pobre Dusty Miller. Era tão engraçado que eu implorei à produção que o colocasse na capa, nem que fosse num cantinho. E lá está ele, se esbaldando nos braços de Anne! A parte mais difícil para mim era falar sobre algumas injustiças e ter que escrever passando tanta raiva com aquela gente mesquinha! Eu brigava com a autora, falando que aquilo não precisava estar ali. Mas… se eu contar mais, vira spoiler!



 Clube do Farol: Para você, quais são as principais diferenças entre traduzir histórias em quadrinhos e traduzir um livro clássico?

 

Ane Forcato: A maior diferença está no ritmo. Quadrinhos são baseados em diálogos e tudo é muito direto. São poucas palavras para muita arte, enquanto que no mundo da literatura clássica o narrador precisa descrever bastante coisas, para que o leitor saiba do que ele está falando. Hoje nós já vimos milhares de imagens de tudo que existe, então um texto contemporâneo precisa de menos descrições. Nos clássicos, o leitor antigo muitas vezes iria apreender um mundo novo do qual ele não tinha conhecimento prévio, então a ambientação era uma ferramenta essencial. Na literatura não se pode abrir não de descrever, mesmo que de forma breve, os lugares e as pessoas. No quadrinho a imagem está dada, então tudo acontece muito mais rápido. Quanto à parte mais técnica, no livro o tradutor vai escrevendo em forma de redação, igual ao original. Já no quadrinho, eu vou fazendo quebras por página, com marcação de balãozinho, e com alguns recursos de capitulação, entre outros que desenvolvi com o artista que vai colar as falas na arte, depois.



 Clube do Farol: Como é o seu processo de tradução e a sua rotina de trabalho como tradutora? Você estabelece metas para si mesma? Em quanto tempo você conseguiu traduzir “Anne de Windy Poplars”?

 

Ane Forcato: Anne de Windy Poplars foi a minha primeira tradução com prazo. Antes, eu produzia sem dia para entregar. De repente, a Editora me diz: 1 (UM!!) mês. Cara… pensa num surto! Bem, depois do susto, eu fiz contas bem simples, dividindo o número de páginas do arquivo pelos dias, e vi quantas páginas eu precisava traduzir ao dia. Para dar conta, foi preciso ficar um mês trabalhando um mínimo de oito horas diárias. Ufa! Foi uma rotina dura, tive colaboração total da família, abri mão de tudo e mergulhei nesse universo. Eu amei cada dia porque adoro Anne. Então foi um presente a oportunidade de passar o dia fazendo isso! Eu trabalho com trilha sonora, sou movida a música, e tudo que escrevo tem seu ritmo próprio. Também sempre leio com trilha sonora, e depois o cérebro reproduz o livro como se fosse um filme, na memória! Pesquisei até encontrar o que fosse totalmente Anne, e me estimulasse a escrever. Utilizei um arquivo de 9 horas, e o ouvia uma vez ao dia, com a obra completa dos métodos Final Fantasy para piano. Ficou perfeito. (Inclusive recomendo a todos que tenham essas músicas em suas vidas: ouvir música complexa estimula o cérebro.)





 Clube do Farol: O que nós (e todos os outros leitores apaixonados por Anne) podemos esperar desse quarto livro? 

 

Ane Forcato: Risos e lágrimas. Eu sou uma manteiga, então chorei mesmo, algumas vezes, em especial com aquelas lindas histórias inusitadas que acontecem pelo meio do caminho, e Anne ou resolve, ou aprende lições que na verdade são lições para nós. Tem romance, tem amizade, tem aquele tempero que faz a gente querer abrir uma dimensão nas páginas e pular lá dentro para ver tudo de perto. Anne e Gilbert estão em cidades diferentes e quase não se encontram, então Anne escreve muitas cartas, e isso é demais, porque ao invés da voz da narradora falar o quê e como ela se sente, ela mesma pega a caneta e se comunica conosco. E vocês sabem como ela é… uma delícia de amiga!



 Clube do Farol: Sabemos que você tem um livro publicado pela Editora Coerência“Tokio2020”, você tem outras obras escritas ou traduzidas por você? Fale um pouquinho do seu trabalho para a gente.

 

Ane Forcato: Meu livro de estreia Tokio2020 vai fazer um ano de publicado em dezembro! O tempo voa… pena que os eventos presenciais de divulgação não aconteceram esse ano, então a procura por ele foi um pouco tímida, eu não sendo ainda muito conhecida em circuitos literários. Dedos cruzados para 2021 arrebentar para a literatura nacional! Tenho projetos em andamento sim, inclusive já preparei a sequência de Tokio2020: SaoPaulo2020. Será uma curta série de três livros. O segundo não foi lançado ainda, porque achei difícil ficar com dois livros parados na pandemia. Mas contrato novo vem logo, logo, para a continuação que está linda de morrer.

Em quadrinhos eu tenho uma lista considerável de traduções de Graphic Novels e muitas séries que não foram publicadas em papel, sendo de distribuição para assinantes, por enquanto apenas em versões eletrônicas.





 Clube do Farol: Para finalizar essa entrevista, gostaríamos que você deixasse uma mensagem para seus leitores (atuais e futuros) no Clube do Farol.

E, claro, de antemão agradecer pela generosidade em dispor de tempo para responder nossas perguntas.


Ane Forcato: Eu fiz Cultura Inglesa em São Paulo com uma japonesa chamada Emi, ela era tímida e inteligente. Os anos se passaram e eu nunca mais a encontrei, mesmo procurando tanto, pelas redes sociais. E mais no passado, lá na oitava série, Suiroshi era um colega de classe reservado, sempre com a irmã Saori. Eles não faziam amizade fácil com ninguém, e ele era lindo! Ok… não rolou nem um "oi", eu também era tímida! E eles se perderam no passado, mas eu nunca os esqueci. Então seus nomes, Emi e Suiroshi, são uma homenagem a colegas japoneses que eu tive. Gostaria que, se um deles lesse meu livro, me mandasse um olá!

Apesar de não ser biográfico, em Tokio2020 eu coloquei várias das minhas paixões reais, como esportes, jogos olímpicos, comida japonesa, Naruto. E além de outras referências, dois episódios aconteceram comigo: a mesma conversa que Emi tem com a reitora em Tóquio, falando sobre estrangeirices, eu tive com o presidente de uma empresa, na Alemanha. E a história que Emi conta no avião, da linda costureira, era um segredinho meu de infância, que eu reparti com todos vocês!

Diversos elogios a Tokio2020 foram além das minhas expectativas, um leitor até falou que é um presente à humanidade! Recebi uma crítica também, de vários, que repetiram que Tokio2020 é muito curto, e quando você ainda quer muito mais, ele já acabou! Então parece que até para quem reclamou, a reclamação foi positiva. Espero que muitos de vocês possam conhecer esse breve romance contemporâneo e que fiquem apaixonados por Emi, porque ano que vem ela volta com muito mais, ao lado de Suiroshi.

A ligação entre Brasil e Japão merece ser contada com histórias de amor e de amizade: a imigração japonesa completa 111 anos, e todos temos muito a celebrar. Kampai!

Muito obrigada pela entrevista, Clube do Farol! 




Conheça mais sobre a autora e tradutora Ane Forcato
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