Você já se perguntou o que passa na cabeça de alguém que arrisca tudo para chegar ao topo da montanha? Ou como é a vida quando está longe das horas entre o pé e o cume do monte? Talvez não, mas todos temos uma curiosidade nata sobre pessoas que saem da curva e conquistam um objetivo, chegam ao topo do “mundo” ou dos seus sonhos. E por isso mergulhei no convite para conhecer não apenas a conquista, mas a caminhada que leva alguém até o seu objetivo.
Se você perder dinheiro, nada se perde. Se você perder saúde, algo se perde. Mas, se perder caráter, tudo se perde...
A narrativa em primeira pessoa deixa os acontecimentos com uma visão menos ampla, porém muito mais imersiva. Preciso avisar que o narrador é "intrometido" em alguns momentos, mas isso é maravilhoso, porque ajuda quem está lendo a compreender as nuances da história, dando uma visão mais clara das emoções e reflexões envolvidas na narrativa. Uma coisa que me chamou demais a atenção é que cada capítulo é como um acampamento base, demarcando o ponto de conquista da montanha, assim vamos, com um acontecimento marcante, fazer uma jornada que começa na infância e esclarece como "nasce" uma atleta e como o aprendizado com a vida anda em paralelo com os do esporte e se fundem formando o todo que vem a ser a pessoa.
Naquele momento, eu descobri que existe algo muito além do limite físico — o psicológico. E depois do psicológico existe o emocional. Esse, sim, é o mais poderoso.
A história trabalha temas como: sonhos, autodescobertas, superação e limites, sendo esses reais ou psicológicos. Quando falo de superação, por exemplo, me refiro aos episódios como ter sido atropelado quando pedalava na Floresta da Tijuca, todo o processo de recuperação pós acidente e ainda uma doença grave quando tudo parecia prestes a melhorar. Ele queria o Everest, o topo do mundo, e ninguém seria capaz de impedi-lo. E ainda consegue trazer uma maneira diferente de olhar temas comuns, deixando a leitura ainda mais instigante. Como quanto narra questões ligadas a família, ele mesmo descreve a marca que o Everest deixou em seu casamento. Tudo é bem amarrado, mas poderia explorar mais os conflitos internos ou as resoluções que, em alguns momentos parecem um tanto quanto fáceis demais.
A leitura durante todo o texto é instigante, em especial nos momentos de suspense e reflexão. Vale ainda dizer que tem uma ótima fluidez, porque as descrições são na medida certa. Sem dúvida ler essa biografia ficou ainda mais especial, porque eu me recordo nitidamente de assistir as reportagens citadas: como do atropelamento e também da subida ao Aconcágua, com a cobertura do repórter Clayton Conservani, unindo memórias ao relato de quem viveu a história, me deixou com a sensação de ver o fato em 3d. Porque além de ganhar novas informações e contornos, eu conseguia visualizar pelas lembranças as cenas narradas por mostrar o que aconteceu além do que a reportagem mostrou.
A magnitude das experiências que uma expedição proporciona é tão rica e apaixonante que se torna altamente viciante para quem tem a chance de provar esse sabor. Contudo, a maior expedição da minha vida é a paternidade, uma história que talvez tenha sido iniciada em alguma outra existência…
As pessoas que fazem parte da história de vida do autor são interessantes e tem um papel fundamental na narrativa, dando vida e leveza ao texto, mas senti falta de um pouco mais de participação deles em questão de situações e momentos, acho que teria enriquecido mais a história, trazendo esse olhar de fora. Como a morte que, além da dor da perda, traz consigo o confronto com a própria mortalidade e as menções ao abalo no casamento que são citados, mas não explicados. O texto tem uma linguagem coloquial e as fotos ajudam ainda mais na interação com o texto e, claro, dão cores e formas ao texto. Notas de rodapé esclarecem termos técnicos ou do vocabulário próprio do montanhismo, além de referências a alguns livros referências dentro do esporte.
Por ser um livro sem diálogos, poderia ter sido uma leitura cansativa, mas não foi. O cuidado com a divisão de capítulos, inclusão das fotos e também o tamanho dos textos, fez a leitura ficar muito fluida e tranquila. Não tem como evitar, algumas repetições, porque muda-se a montanha mas mantém-se o esporte. Gostei muito de não ser um livro que tenta te motivar a praticar o esporte ou ser um atleta, mas sim como ser alguém melhor e usar tudo de si para superar desafios e obstáculos, além da história incrível da própria vida do Roman. Confesso que dei algumas buscas no Google para enriquecer mais a leitura e saciar a curiosidade em alguns pontos, o que só mostra como a leitura foi excelente. Boa leitura e divirta-se!
Informações Técnicas do livro
Além dos Sonhos
Da cama ao cume. A história do homem que desafiou o impossível
Roman Romancini e Rafael Duarte
Ano: 2022
Páginas: 176
Editora: Valentina
Sinopse:
A mochila do Roman Romancini está quase sempre pronta para a próxima investida. Além de ótimos equipamentos, o otimismo sempre foi uma das principais ferramentas para seguir em frente. A vontade de ir além dos sonhos é tão grande que, às vezes, parece beirar a arrogância, mas é o jeitão dele mesmo, sempre positivo e dono de uma vontade contagiante. Não fosse isso, talvez o Roman nem estivesse mais aqui.
Ficamos amigos durante a escalada do monte Aconcágua, no inverno de 2004. É lógico que o Roman era o mais eufórico da expedição. Eu fiquei pelo caminho, mas me lembro bem da imagem do Roman, emocionado e falante no topo das Américas, com os cílios congelados.
Também estivemos juntos no Denali (monte McKinley, Alasca). A montanha mais alta da América do Norte. Dessa vez tive um pouco mais de sorte. Cheguei ao topo, e o Roman ficou a vinte metros do cume. Quase saiu voando de tão forte que era a tempestade.
Contudo, os ventos não foram muito favoráveis para o meu amigo nos anos seguintes, no que diz respeito ao lado esportivo. Foi atropelado quando pedalava na Floresta da Tijuca, colocou uma placa de titânio no fêmur, teve trombose durante a recuperação e, para completar o ciclo, câncer na tireoide. Pegou um médico pelo colarinho quando ouviu que não iria mais poder escalar. Ele queria o Everest, o topo do mundo, e ninguém seria capaz de impedi-lo.
Provou que estava de volta quando corremos juntos na Patagônia. Cem quilômetros de parceria e amizade. Depois disso, eu não tinha mais dúvidas, o Everest era só uma questão de tempo.
Esse é o Roman, enxerga luz nos momentos mais sombrios. O mundo dele é diferente, vibrante e imponente. Transforma um momento simples numa história fabulosa. Suas asas são enormes, desenvolveu o dom de voar para lugares que as pessoas normais talvez tenham dificuldade de enxergar e compreender.
(Clayton Conservani)
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