09 novembro, 2018

Resenha :: A Sombra de Dália

novembro 09, 2018 2 Comentários

Olá, quero dividir com vocês uma leitura que me fez sentir tanto e pensar a respeito de vários assuntos de forma leve e profunda.

Narrado pela própria Dália, vamos conhecendo sua vida à medida que ela pensa sobre os rumos que a mesma tomou e quantos sonhos foram deixados pelo caminho após a conclusão do ensino médio. Como o senso de dever e obrigação podem ser ao mesmo tempo uma virtude, quanto uma prisão. E assim vamos entendendo o porquê ela vive há três anos nessa rotina, enquanto toma a decisão de trabalhar sozinha na lanchonete, enquanto sua mãe está adoentada e não pode dividir a rotina do trabalho com ela.

Minha mãe havia me ensinado a ser forte e lágrimas eram apenas demonstração de fraqueza e descontrole.

E assim, com os pensamentos focados em orgulhar a mãe por seguir os seus ensinamentos e uma dose saudável de medo pela falta de companhia, no trajeto para o trabalho e a volta para casa, Dália se depara com um cão lindo, que parece insistir em ser sua sombra, não atendendo a seus comandos para ir embora. A mãe sempre foi radicalmente contra animais, porém nos momentos de solidão a persistência de sua "sombra" começa a mexer com as certezas de que a mãe está certa a esse respeito.

Sombra, como ela o apelida, acaba mudando conceitos e trazendo muito mais do que uma amizade incondicional. E a partir dessa nova amizade, vamos conhecendo o passado que fez a mãe de Dália ser uma mulher tão difícil a ponto de odiar animais de estimação e o porquê do abandono de tantos sonhos e projetos por parte da filha. 

Não sei o que seria de nós a partir daqui, mas se o ritmo do meu coração era algum prenúncio, acho que não haveria nenhum momento sem fortes emoções.

Como o amor verdadeiro e desinteressado dos animais pode ser o que falta para questionarmos a ausência desse mesmo sentimento em nossa vida entre humanos, iguais. Tentar entender como sempre tentamos ganhar a aprovação de quem amamos, enquanto deixamos de ser e lutar pelo que realmente acreditamos. Ver de forma tão clara, como o rancor e o orgulho são apenas sentimentos destrutivos, que fazem mais mal a quem os sente, do que a quem os sentimentos estão dirigidos.

Creio que deu para entender o quanto o conto mexeu com minhas emoções e considerações a respeito das atitudes, decisões e opções que fazemos e que irão interferir na vida daqueles que amamos e que estão ao nosso redor, que ninguém é uma ilha e mesmo no deserto uma flor é capaz de tornar tudo mais bonito e menos árido.

O conto é bem escrito, tem uma narrativa fluida e delicada. Explica de forma bem estruturada os principais conflitos e pontas da trama. Acho que o único "pecado" foi o gostinho de quero mais, saber mais... que deixou quando a leitura terminou.


Nota :: 


Informações Técnicas do livro

A sombra de Dália
Ano: 2018
Páginas: 80
Editora: Editora Cappia
Sinopse:
Ajudar a mãe na lanchonete Sabores da Margarida é a última coisa que Dália pensaria em fazer depois de concluir o ensino médio. Porém, depois de três anos nessa rotina, ela apenas aceitou seu destino de seguir os passos da mãe, que tanto ama e admira.
Em uma madrugada, a mãe de Dália fica doente e ela precisa assumir a lanchonete sozinha. Focada apenas em trabalhar por duas, um cachorro abandonado aparece para lhe fazer companhia e desmistificar tudo o que sua mãe falou sobre ter um amigo peludo.
Sombra, como ela o apelida, acaba mudando conceitos e trazendo muito mais do que uma amizade incondicional.



 _____Sobre a Autora_____

Mari Sales


Mari Sales é mãe e esposa em tempo integral, analista de sistema durante o horário comercial e leitora assídua durante as noites e madrugadas. Nos intervalos entre suas vocações, procura escrever quase tudo o que vem à mente e resenhar os livros que lê. Entusiasta das obras nacionais de romance contemporâneo, contribui com esse universo literário através do blog Resenhas Nacionais e contribuiu, em 2017, com a publicação da obra Superando com Amor.


08 novembro, 2018

Resenha :: O Último dos Canalhas (Canalhas #2)

novembro 08, 2018 1 Comentários

Oi, Faroleiros.

O Último dos Canalhas é o segundo livro da série Canalhas lançado no Brasil pela Editora Arqueiro. Mas ele é, na realidade, o quarto livro da série escrita pela americana Loretta Chase.

Em O Príncipe dos Canalhas a gente torceu pelo amor entre o Marquês de Dain, conhecido como Lorde Belzebu, e Jéssica Trent. Agora, chegou à vez de conhecermos mais sobre Vere Mallory, o Duque de Ainswood.

Atenção: Se você ainda não leu O Príncipe dos Canalhas, esta resenha contém spoilers. Aproveite para saber o que achei do primeiro livro da série Canalhasclicando aqui.

O Canalha da vez é Vere Aylwin Mallory. Se você tem boa memória, vai se lembrar do Duque de Ainswood. Ele é amigo do Marquês de Dain. Estudaram juntos no internato Elton e foi ele quem, bêbado, confundiu Jéssica, esposa do Marquês, com uma prostituta durante a lua de mel deles. Lembrou? Pois é! Este é Vere Mallory.

Mas, Loretta Chase continua escrevendo seus prólogos e mostrando que a atual Fera também tem um coração. Vere foi nomeado o guardião dos 3 filhos do primo Charlie, quando este faleceu. Ele ficou com o garoto Robin por 6 meses enquanto a família estava de luto. Menos de três semanas após ter devolvido Robin para as suas tias, Mallory é chamado às pressas. Robin havia contraído difteria e foi Mallory que ficou ao seu lado até as últimas horas.

— Tudo bem, Robin — disse ele. — Eu estou aqui. Vou lutar contra a doença por você. Deixe-a ir, entregue-a para mim. Ouviu garoto? Jogue fora essa enfermidade maldita e deixe que eu a enfrente. Eu consigo, você sabe disso.

A morte de Robin, o sexto Duque de Ainswood, traumatizou tremendamente Mallory que acabou não aceitando bem as responsabilidades de ser o sétimo Duque de Ainswood.

O depravado Vere Mallory conhece a jornalista Lydia Grenville durante uma discussão dela com a cafetina Carolie Bress num beco da Russel Court. Lydia salvava a jovem Tamsin Prideaux das garras da cafetina, mas é interrompida pelo inconsequente Ainswood.

Os dois discutem e no final ele acaba dando um beijo na boca dela, mas ela reage e desfere um golpe no queixo dele, deixando-o caído de costas numa poça de lama. Durante a confusão a cafetina foge e Lydia consegue resgatar Tamsin. Mallory fica indignado e deseja manchar a reputação dela como forma de vingança.

Lygia trabalha no Argus, um jornal que tem como objetivo tornar a população bem informada, observando sem se abalar e relatando à metrópole como se tivesse cem olhos. Os artigos e ensaios da Srta. Greenville são tremendamente populares entre as mulheres, onde ela costuma atacar os nobres como o Duque. Sua vida é aquele jornal e não está interessada em nenhum tipo de romance.

Nessa disputa de quem é superior, Vere e Lydia fazem de tudo para humilhar e derrotar o seu rival ao mesmo tempo em que tentam esconder o desejo que um sente pelo outro.

Tão loucos quanto o mar e o vento, quando ambos disputam quem é mais poderoso — declamou ela.

Não achei a capa do livro tão chamativa, mas ao ler as característica de Vere Mallory e conhecer um pouco sobre o seu desleixo em se vestir e ser arrumar, o modelo que aparece na capa o representa perfeitamente com aquele cabelo rebelde.

O embate entre Vere e Lydia é cativante e hilário. Lydia é uma mulher livre e trabalhadora e através de sua vida e das críticas sociais que escreve no jornal, Loretta Chase defende algumas ideias feministas que não condizem com a época. Porém a autora é mestre em fazer isso: transformar um Romance de Época em algo atemporal. Afinal, a narrativa, o toque erótico (bem mais sutil aqui do que em O Príncipe dos Canalhas) e os ideais modernos não refletem o período tratado no livro. Não interpreto isso como uma falha. Fica claro que o propósito da autora é o entretenimento.

— Nós precisamos viver vidas reais, querendo ou não — observou Vere. — E você sabe, melhor do que a maioria das pessoas, que tipo de vida a grande massa da humanidade leva. Dar a ela algumas horas de folga (entretenimento) é entregar um enorme presente.

Ao ler este segundo livro de Loretta Chase, ficou claro a forma de narrativa que ela usa. Não costuma enrolar para que os casais se acertem, o que é ótimo. Mas ela sempre traz uma reviravolta após isto se resolver para movimentar a história e a narrativa ganhar mais fôlego. Depois que Vere e Lydia se acertaram (ok, isso não é um spoiler, não é mesmo?) e ainda faltavam bastante páginas para ler, fiquei esperando a reviravolta.

Adorei rever alguns personagens do livro anterior. Aos poucos eles vão aparecendo na história e se tornando relevantes. Como este é o último livro da série, vou sentir falta dos personagens adoráveis e cativantes criados pela autora.

Pena que a Arqueiro não lançou e nem pretende lançar os outros dois livros que faltam dessa ótima série. A diagramação da editora é muito boa, apesar de ter achado um grosseiro erro de digitação.

Agradeço a minha amiga Adriana, do blog Meu Passatempo Blablabla, por ter me indicado e emprestado os dois livros da série.

Com  amor, André



Nota :: 


Informações Técnicas do livro

O Último dos Canalhas
Ano: 2015
Páginas: 304
Editora: Arqueiro
Sinopse:
O devasso Vere Mallory, duque de Ainswood, está pronto para sua próxima conquista e já escolheu o alvo: a jornalista Lydia Grenville. Só que desta vez, além de seduzir uma bela mulher, ele deseja também se vingar dela.
Ao se envolver numa discussão numa taverna, Vere foi nocauteado por Lydia e se tornou alvo de chacota de toda a sociedade. Agora ele quer dar o troco manchando a reputação da moça.
Mas Lydia não está interessada em romance, principalmente com um homem pervertido feito Mallory. Em seus artigos, ela ataca nobres insen- satos como ele, a quem considera a principal causa dos problemas sociais.
Nesse duelo de vontades, Vere e Lydia se esforçam para provocar a der- rota mais humilhante ao mesmo tempo que lutam contra a atração que o adversário lhe desperta. E, nessa divertida batalha de sedução e malícia, resta saber quem será o primeiro a ceder à tentação.

06 novembro, 2018

Tag Literária :: Chá Quentinho para Outono

novembro 06, 2018 0 Comentários



Olá Faroleiros, tudo bom?

Navegando pelo Instagram encontrei a TAG Chá Quentinho para Outono, a criadora dela é a Lily Nunes do Um Chá de Leitura (@umchadeleitura), caso queira conferir as respostas dela, basta clicar aqui.



 Chá de Camomila — Um livro que acalmou você em situações agitadas: 
O Hobbit foi uma leitura leve e divertidíssima que já me ajudou algumas vezes durante minha vida, um livro que mora no meu coração!


 Chá de maçã e canela combinação perfeita — Um personagem do livro que você se identificou:
Cláudia da série Crônicas Vampirescas de Anne Rice, não consigo nem explicar tudo o que sinto por ela em palavras, não é a toa que tenho ela tatuada.


 Chá mate forte, mas viciante — Um livro que trate de um assunto forte ou delicado, mas você ficou envolvente com a história:
A Bibliotecária de Auschwitz de Antonio G. Iturbe, um livro que me fez derramar lágrimas diversas vezes durante sua leitura, mas trouxe uma mensagem poderosa. Caso queira conferir minha resenha, clique aqui.


 Chá de Hortelã cheirinho refrescante me ajuda a respirar — Um livro com uma história de amor que te faz suspirar: 
Serei meio que obrigada a citar o casal David e Marie, da série Damas Perfeitas da autora Nahra Mestre. Eles me conquistaram de vez!
Caso queira conferir as resenhas da série, clique nos links a seguir:


 Chá de morango, sei que existe, mas nunca tomei — Um livro antigo que muita gente leu menos você: 
Frankenstein de Mary Shelley! Apesar de amar o gênero até hoje não me aventurei na leitura desse clássico, será que consigo o ler ainda este ano?


Abraços e até a próxima!

02 novembro, 2018

Resenha :: Diário do Amor Desenfreado

novembro 02, 2018 1 Comentários

Eu esperei o livro me chamar para ler, não abri, não folheei. Aguardei o momento e deixei que fosse especial. Estou aqui sentada no computador, tentando colocar meu coração em palavras, em frases que consigam explicar o que foi ler esse livro. Tammy Luciano, se eu nunca tivesse lido nada seu, teria me apaixonado por sua escrita nessa obra. Um livro de uma alma absurdamente feminina: livre, presa, guerreira, viva!!


Sem minha mente, todos vão descobrir que meu corpo não tem valor.

Os textos, poemas e sentimentos são de um empoderamento único, do ser e do sentir das palavras às ilustrações. Talvez eu ainda esteja escrevendo a flor da pele, mas a leitura fez bem para a alma, para o ego. Foi como olhar em um espelho e me ver, ver tantas outras: uma amiga, uma irmã, uma mãe e uma filha. E assim, de página a página, fui lendo sobre o amor, mas senti que o amor ali, é o amor próprio, que vem antes de amar outro alguém. Afinal a medida do nosso afeto é aquele que sentimos por nós mesmos. E que quando outros amores vêm, tem mais verdade.


Porque quando estou só, as mentiras gritam comigo. Reclamam seus direitos, minha verdade me trata melhor.

Lendo sobre aquela força de vontade de levantar a cada dia e garantir o lugar ao sol, de tentar, de ser, buscar, se permitir ser triste, mesmo sendo mais vezes feliz. De não ter vergonha de falhar enquanto continua tentando o acerto, de viver cada dia intensamente até que a lua chegue para mostrar tudo igual de um jeito diferente.


Diário do Amor Desenfreado é um mergulho sem igual nos maiores segredos de quem ler. De se redescobrir nas palavras, nas imagens, nas partes em branco. Esse livro é um presente que cada leitor pode se dar, mas não é um livro para ser lido e sim vivido, apreciado, relido. Guardado e revisitado várias vezes, para cada vez poder se perder nas páginas e no final se encontrar melhor, diferente.


Além dos textos primorosos, as imagens, edição, cada detalhe foi pensando pra uma experiência única de leitura. A capa foi feita de maneira impecável reproduzindo a imagem dentro da imagem, com detalhes que a própria autora só reconheceu depois da ilustração pronta, tão ela.  A diagramação e as ilustrações são perfeitas e de uma beleza impar. A editora fez um trabalho lindo com esse livro.


E termino por aqui, afinal "sou dessas".

Sou dessas pessoas diferentes. Odeio ser igual.


Nota ::  4,5


Informações Técnicas do livro

Diário do Amor Desenfreado
Ano: 2016
Páginas: 92
Editora: Qualis Editora
Sinopse:
Um livro com palavras em estrofes que falam de amor, ilustrações mágicas e um diário interativo para guardar suas emoções mais secretas!
Diário do Amor Desenfreado poderia ser considerado um livro de poesia. Poderia, se o trabalho da escritora Tammy Luciano não fosse repleto de novidades e reinvenções, tentando sempre fugir de rótulos e explicações óbvias. Os textos contidos no livro mais parecem letras de música, com um mergulho íntimo sobre sentimentos que deixam na dúvida ficção e realidade. Assim como também se misturam o presente e o passado, as rimas e as desconexões, a dor de amor e a paixão intensa. Nessa mescla está você, leitor, que poderá escrever nesse diário interativo, como se ele fosse mais seu do que nunca. Entre as palavras da Tammy estarão as suas declarações, formando então um conjunto de sentimentos, com um conteúdo sem freio, cheio de potencialidades e energia como os batimentos de um coração quando se apaixona.


 _____Sobre a Autora_____

Tammy Luciano


Tammy Luciano é atriz, jornalista e escritora, autora de poesias, mais de 30 peças de teatro (entre elas: Krikilin Rima com Ziripin, A rua Daqueles Homens, O Menino que Escreveu o Mundo, Casados e Surtados...), crônicas e dos livros "Fernanda Vogel na Passarela da Vida", "Novela de Poemas", "Sou Toda Errada", "Garota Replay", que a fez se tornar a primeira escritora brasileira do Selo Novo Conceito Jovem, da Editora Novo Conceito, "Claro Que Te Amo!" que esgotou a primeira edição em apenas um mês e meio de lançado, Sonhei Que Amava Você, Escândalo!!! (lançados pela Editora Valentina) e Diário do Amor Desenfreado (Qualis Editora).
Formada em Artes Cênicas e Jornalismo, fez especialização em roteiro em Washington DC, EUA. Atua tanto quanto escreve, teve por mais de dez anos um grupo de teatro no Retiro dos Artistas, Rio de Janeiro, foi colunista do JB Online e do site Baguete Diário, apresentou o quadro Tá no Papo do Hipermídia do Globo.com, participou como atriz de diversos espetáculos teatrais, em novelas como Uga-Uga, Laços de Família, Caminhos do Coração, episódios do Linha Direta, A Grande Família, foi repórter do Programa TV Fama, da Rede TV! e esteve em uma divertida entrevista no Programa do Jô, da Rede Globo. Hoje, além de escrever seus livros, viaja o Brasil encontrando seus leitores e grava vídeos para o seu Canal no Youtube.

31 outubro, 2018

Resenha :: A Intrusa

outubro 31, 2018 5 Comentários

Não sei você, mas quando eu estava no ensino médio, ao estudar literatura, a minha professora pedia para que lêssemos, a cada dois ou três meses (ou até menos), livros clássicos nacionais (ou até portugueses) do período literário que estivéssemos estudando no bimestre. E por isso conheci obras clássicas de diversos autores nacionais, como Machado de Assis, José de Alencar, Joaquim Manuel de Macedo, Aluísio Azevedo, Raul Pompeia, Álvares de Azevedo, Gonçalves Dias, Eça de Queirós... entre muitos outros.

Mas entre tantos livros e autores, foram pouquíssimas autoras. Se a minha memória não estiver me enganando, as únicas autoras nacionais que li algo, quando estudava literatura no ensino médio, foram Rachel de Queiroz, Cecília Meirelles e Clarice Lispector. E todas elas nasceram já no século XX. E as autoras do século XIX? Cadê? Pode não parecer, pensando só em autores “famosos”, mas elas existiam e mereciam mais destaque e não serem esquecidas. Uma das autoras nascidas no século XIX é a Julia Lopes de Almeida, autora do livro da resenha de hoje.
A romancista (contista, cronista e teatróloga) Julia Lopes de Almeida nasceu em 1862, no Rio de Janeiro, e desde muito nova tomou gosto pela escrita, porém, por causa das possibilidades limitadas da época, resolveu escrever escondido, mas o segredo não durou muito, e contrariando as expectativas, foi incentivada pelo pai que a inseriu no meio literário, começando a escrever em revistas e jornais, contando até com resenha de livro (só eu que acho que ela poderia ser uma bela blogueira?). Tempos depois disso, publicou contos, crônicas, peças de teatro e romances, ainda no século XIX e também no XX.

No final do século XIX, em 1897, a Julia, junto com o seu marido, Filinto de Almeida (com quem havia se casado aos 25 anos), fez parte das discussões iniciais que deram origem a Academia Brasileira de Letras. Sim! Ela fez parte do grupo que fundou a ABL! E, devido à sua contribuição e ao seu “peso literário” na época, o seu nome até constava na lista feita por Lúcio de Mendonça em “O Estado de S. Paulo”, seis meses antes da fundação da Academia, em que contava com os quarenta nomes que pareciam merecer serem reconhecidos como fundadores da ABL. Maaaaaas, mesmo sendo conhecida como a maior escritora do seu tempo, foi excluída simplesmente por ser mulher, com a sua “vaga” ficando para o seu marido, Filinpo.

E assim seu nome foi apagado da história de algo tão marcante, junto com outras escritoras importantes, pois só admitiram mulheres, em 1977, quando a Rachel de Queiroz foi eleita para uma cadeira. É meio triste e decepcionante, né?! Alguém ser “excluído” de algo em que colaborou desde o princípio, simplesmente por causa do sexo.

Júlia é uma autora magnífica. Não é nenhum favor resgatá-la. Ela é um caso absurdo de escritora que não está no cânone literário por puro machismo. Ela é muito superior à grande maioria dos autores de sua época. Os únicos que se equipararam naquele momento são Aluísio Azevedo e Lima Barreto. (Escritor Luiz Ruffato)

Bom, agora temos que parar de falar dessa autora fascinante (vou deixar algumas dicas de artigos e publicações sobre ela no final da resenha, porque sim), e vamos, finalmente, à resenha de um de seus romances, A Intrusa, publicado em 2016 pela Pedrazul.


As asas do tempo têm forte envergadura; não cansam de voar, mas levam às vezes consigo penas que se não mudam, embora fiquem disfarçadas entre outras que vão nascendo...

Narrado em terceira pessoa, A Intrusa se passa no fim do século XIX, no Rio de Janeiro, em plena Belle Époque. Nele conhecemos o advogado Argemiro, que é viúvo há nove anos, e está querendo melhorar a ordem na sua casa, ou melhor dizendo, diminuir a desordem, e conseguir que a visita de sua filha de onze anos, Glória, que vive com os avós (por quem é mimada), seja possível, e pensando nessas questões decide contratar uma governanta, para colocar ordem na casa e educar e cuidar da sua filha.

Com a ajuda do seu amigo, Padre Assunção, escreve um anúncio em um jornal, mas só uma candidata se apresenta à vaga, a Alice Galba, que na “entrevista” aparece toda coberta e parece não ter boa aparência, mas nada disso é um problema, já que uma condição estranha do Argemiro para contratar a governanta é a de que ele nunca deve vê-la, pois no leito de morte, a sua esposa o fez prometer que nunca se casaria novamente, então prefere evitar a “tentação”.


A Alice aceita e melhora a vida dele 200%. Sua casa se tornou impecável, limpa, com tudo em ordem, com flores, perfumada... A sua filha Glória? Cada dia mais educada e bondosa. E ele realmente nunca vê a sua governanta, apenas sente a sua presença, e se encanta por ela cada vez mais.

E o que me delicia é sentir a alma dessa criatura, que aqui tenho debaixo do meu teto, sem que nunca os meus olhos a vejam nem de relance... Ela se esconde, ao mesmo tempo em que se espalha pela casa toda. É a mulher-violeta, positivamente, não há outra comparação!

Mas quase ninguém acredita que ele nunca a vê, pensam até que ela é sua amante! A sua sogra, uma baronesa, principalmente, no auge de seu ciúme, fica tão convicta que o Argemiro está quase quebrando a promessa que fez a sua filha, que começa a considerar a Alice uma grande inimiga, fazendo de tudo para tentar tirar a governanta da vida de seu genro e de sua neta.

Sujeita-se a exercer um lugar suspeito, aceitando todas as condições que lhe impõem e revela uma sensibilidade rara em todos os atos em que podemos a apreciar... Será ela na verdade a mulher perigosa, não pelo que calcula e inventa, mas pelo que merece?

Enquanto isso, a curiosidade e a admiração de Argemiro pela sua governanta aumenta cada dia mais, e aos pouquinhos um novo sentimento vai de desenvolvendo bem sutilmente. Conseguirá a sogra ciumenta o que tanto deseja? No que resultará esse novo sentimento e a admiração de Argemiro?


É extraordinário. Desde que esta mulher entrou em minha casa eu sou outro homem, muito mais tranquilo e muito mais feliz. Nunca a vejo, mas a sinto; sua alma de moça enche estas salas vazias de juventude e de alegria.

Se você ler esse livro esperando um “romance” que acontece do jeito que estamos acostumados, vai cair do cavalo, porque ele é bem sutil. A autora descreveu muito bem a sociedade em que viveu, com pequenas críticas ao mostrar como agiam algumas pessoas daquela época através de seus personagens.

— Glória casará bem, com um homem que a ame e a respeite. Não faltava mais nada! Minha neta mal casada! Pobre... desprezada... precisando trabalhar para viver... que coisa horrível! 
— O que é horrível, mamãe, não é trabalhar; é não saber trabalhar!

Personagens esses que eu achei bem construídos, com qualidades, defeitos e mistérios. Mistérios que envolvem principalmente a Alice, porque não sabemos praticamente nada dela, só que os outros personagens vão descobrindo. O Argemiro não é do tipo de mocinho que a ficamos suspirando, mas é admirável.

Outros personagens que merecem destaque são a sogra do Argemiro, a baronesa, e o Padre Assunção. A baronesa é do tipo de personagem que pegamos ranço, porque que mulherzinha irritante! Ela é doente de tão apegada à memória da filha, que mesmo morta, ela age como se estivesse presente. O Padre Assunção acho que foi o personagem mais bem construído do livro, também com seus defeitos, qualidades e mistérios.

[...] Ela para mim não é uma mulher, mas uma alma. Não a vejo, não lhe toco, a sua imagem material é para mim tão indiferente como um pedaço de pau ou uma pedra. Para mim, basta-me a sua representação, neste aroma, peculiar dela e que paira sutilmente por toda a minha casa; nesta ordem, que me facilita a vida, e no gosto com que ela embeleza tudo em que toca e em que pousa a vista. É uma educada. Parece-me que ela deve ter estudado à sombra de castanheiros ingleses, entre campos de tulipas e jacintos tão diversa ela me parece ser das outras mulheres.

A escrita da Julia Lopes é muito boa, mas como é um clássico não dá para dizer que flui facilmente como um romance da atualidade, mas a leitura fluiu bem para mim.


O único ponto que não foi totalmente positivo, na minha opinião, foi o final, achei ele meio “corrido”, com a resolução de muitas coisas em pouco tempo e com algumas coisas que eu terminei de ler querendo saber mais. Mas nada que tire o brilho da obra em si.

Como é um clássico nacional, o e-book A Intrusa pode ser adquirido gratuitamente no Domínio Público e na Biblioteca Nacional, mas eu sinceramente indico que a leitura seja feita pela edição da Pedrazul, porque eles adaptaram algumas palavras (sem prejudicar o livro), tornando a leitura mais fácil e prazerosa. Além disso, realmente acho que se todo clássico nacional tivesse capas e edições assim, muitas pessoas parariam de ler clássicos “obrigadas”.


A Intrusa é um livro que veio mostrar a força de uma autora que sofreu certo preconceito no seu tempo e também mostrar que o amor surge das mais inesperadas formas, que nem sempre precisamos de mil palavras ou conhecer a aparência para alguém nos fazer bem, às vezes apenas sentir a presença e zelo é o suficiente.

Nunca a vi, mas a conheço, adivinhei-a; abstraí da personalidade. Ela é o meu conforto; a minha segurança, a minha felicidade.


Nota ::  4,5


Informações Técnicas do livro

A Intrusa
Ano: 2016
Páginas: 232
Editora: Pedrazul
Sinopse:
Um clássico nacional à moda europeia! A história de uma jovem governanta chamada Alice Galba.
Julia Lopes nos transporta para o fim do século XIX. O Rio de Janeiro vivia o auge da cultura cosmopolita, a Belle Époque, marcada por profundas transformações culturais que se traduziam em novos modos de pensar e de viver o cotidiano. Em meio à aristocracia carioca, um rico advogado – viúvo, mas ainda jovem e atraente – era perseguido por mães casamenteiras que desejavam ter um genro abastado e influente. Porém, ele se esquivava resoluto, pois prometera à esposa, no leito de morte, manter sua viuvez. O casamento com a filha de um barão resultou em um fruto: uma garotinha mimada e sem modos, criada pelos avós maternos, cuja avó baronesa fazia-lhe todas as vontades. Infeliz pela má educação da menina, ludibriado por um escravo que usava as suas roupas, fumava os seus charutos, bebia fartamente da adega e ainda inflacionava as contas da casa, ele decide contratar uma governanta. Desconsiderando todas as críticas feitas pelos amigos e pela sogra ciumenta, ele pede ajuda ao padre Assunção, seu amigo de infância, e publica um anúncio num jornal à procura de uma governanta. Atendendo ao anúncio, aparece Alice Galba, que aceita a estranha condição: que o patrão jamais a visse. Quando ele entrava pelo portão, ela se escondia. Dela ele apenas sentia o perfume e sua boa influência no lar e na educação da filha. Suas roupas agora estavam impecáveis, a mesa sempre bem posta e arranjada com esmero, a comida saborosa, os móveis reformados, de forma que começou a desejar ardentemente voltar para sua (agora agradável) moradia. Vez ou outra encontrava um livro aberto, esquecido sobre uma poltrona e, com o passar dos meses, passou a notar a doce presença da alma da moça pelos cômodos do casarão. Alma cujo rosto ele já ansiava ver!

Editora Pedrazul atualmente é a editora que mais se dedica à tradução e à publicação de obras mundialmente consagradas, algumas ainda desconhecidas no mercado editorial brasileiro, como os autores que influenciaram o estilo da mais famosa escritora inglesa de todos os tempos, Jane Austen. Também atua no segmento romance histórico e de época escritos por autores contemporâneos.